terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Terminou 2009 !

Estamos em franca recuperação de uma crise financeira que assolou o planeta e que foi particularmente cruel com a indústria mineral em todos os seus estágios e ramos de atuação. Ações despencaram, empresas júnior fecharam, grandes empresas revisaram seus orçamentos, inúmeros profissionais experientes foram dispensados e tudo mais de ruim que poderia sair da caixa de maldades de uma crise desse porte. Foi um ano de angústias e sofrimentos que esperamos estar chegando ao fim.
Felizmente agora já podemos aplicar colheradas de bom humor usando por exemplo a genial frase de Apolinário Torelly, o nobre Barão de Itararé que usou os bondes como objeto de metáfora "Na vida tudo é passageiro, menos o motorneiro e o cobrador."
A perspectiva para o próximo ano é muito boa, com uma retomada dos investimentos em exploração, empurrada por uma crescente demanda por commodities minerais nem que seja por inércia, de uma economia chinesa que vai de 6 a 7 % de crescimento ao ano.
Desejo a todos os leitores do blog, frequentes ou eventuais, um excelente 2010 com muitas atividades, lazer, paz, saúde, exercício de inteligência e criatividade para superar os obstáculos, pois se não fossem esses, a vida não teria a mínima graça.
Esse blog teve uma média de 28 acessos/dia e, no final de dezembro deve totalizar 4.000 acessos de 32 países o que, é claro me deixa feliz e com uma sensação de sucesso alcançado.
Tentarei retornar em 2010 com esse espírito, postando matérias, algumas com arcabouço técnico e outras  variadas e leves, mas sempre tentando colocar algumas reflexões sobre esse tema apaixonante que é a aplicação da geoquímica à exploração mineral.
Um grande abraço a todos e vamos abrir a champanhe !

Da longa e interminável série "Geoquímica, geoquímica, quantas bobagens se cometem em teu nome..."

Atualmente estou montando uma base de dados litogeoquímicos da Formação Serra Geral (cerca de 1.000.000 k2 e 1.600 m de espessura de basaltos, andesitos, dacitos e riolitos). Estão reunidas cerca de 4.300 amostras coletadas em superfície e em poços e compiladas de dezenas de dissertações, teses, artigos ou recebidas em tabelas de dados enviadas por seus autores do Brasil e do exterior.
Nessa pesquisa, descobri na internet um resumo de congresso, apresentado por um grupo de pesquisadores da área de química. Coletaram amostras de pó de basalto e as analisaram  por fluorescência de Raios X, para estudar os impactos ambientais da aplicação desse produto na agricultura, o que em si só já é questionável, pois o teor dos elementos por fluorescência de raios X é total e não biodisponível, e mais ainda que foram analisados apenas os óxidos.
Mas voltando ao tema principal, a tabela de resultados apresentada no dito resumo mostra que as duas amostras analisadas teriam mais de 40% Fe2O3 total e cerca de 21 % SiO2. Espantado com esses resultados, enviei uma mensagem ao primeiro autor, alertando-o para o evidente erro. A resposta veio dois dias depois, me informando que todos os resultados havia sido revistos, que realmente o Fe2O3 tinha valores mais altos que SiO2 e que todos os resultados estavam corretos. Como sou insistente - ou melhor, muito chato - escrevi nova mensagem alertando que esses resultados de SiO2 estavam evidentemente errados e que se por absurdo estivessem corretos, só isso seria motivo de um artigo em periódico científico internacional de qualidade A, pois pela primeira vez rochas ultrabásicas teriam sido encontradas à superfície na Formação Serra Geral, menos silicosas até que dunitos e peridotitos. Nova resposta me informou que realmente as rochas analisadas eram básicas pois os solos tinham pH = 8,03. Não resisti a tamanha barbaridade e enviei uma nova mensagem, um pouco mais ríspida, esclarecendo ao nobre discípulo de Schonbeim que as rochas são básicas ou ácidas pelo seu conteúdo em SiO2 (um óxido ácido) e não pelo valor do seu pH. Estupefato, "enfiei a viola no saco" pensando qual seria o próximo capítulo dessa longa e interminável série "Geoquímica, geoquímica, quantas bobagens se cometem em teu nome..."

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Exploração geoquímica x agricultura

Respondo a uma pergunta de um leitor do blog.

"Meu caro, estou com a segunte dúvida:  se minha malha de amostragem de solo cruzar área de lavoura (plantio de soja, milho e etc.) devo coletar as amostras ? Em outras empresas éramos (os técnicos) aconselhados a não coletar. Você tem alguma sugestão?"

Essa dúvida, tem uma resposta que eu não gosto, mas que frequentemente precisa ser usada : Depende !

Se for uma lavoura recente (1° plantio) em uma área remota, sem aplicação de pesticidas e/ou fertilizantes e/ou corretivos me parece que, em princípio não há problema. porém é necessário que o técnico amostrador registre na caderneta de campo, a situação de cada amostra coletada.
Se estivermos buscando ouro ou diamante, com contagem de pintas ou descrição mineralógica em concentrados de bateia, também não me parece haver grandes problemas, exceto que os horizontes superiores do solo serão revolvidos e destruídos pelos equipamentos agrícolas como o arado de discos.
A questão dos corretivos agrícolas é muito séria, pois a legislação exige deles apenas uma breve caracterização quanto a teor de CaO, MgO, residuo insolúvel (SiO2), granulometria e poder de neutralização - PRNT. Os elementos menores e traço não são analisados pois não são exigidos pela norma legal.
Corretivos agrícolas que são produzidos a partir de margas e calcários com muita matéria orgânica, são naturalmente enriquecidos em diversos metais usados na exploração mineral como indicadores e farejadores de depositos minerais, como Pb, Cu, Cd etc.. O problema se amplifica quando tratamos de fertilizantes produzidos a partir de fosforitas.
Uma vez, entrei casualmente numa loja de produtos agrícolas e examinei a formulação/composição química  impressa na embalagem de um fertilizante. Encontrei 6% N; 16% P; 16% K; 2% Mg; mas também 4,2% S; 0,15% B; 0,5% Zn (5.000 ppm Zn); 0,05% Cu (500 ppm Cu); 0,3% Mn (3.000 ppm Mn); 0,01% Mo (100 ppm Mo) e 0,0023% Co (23 ppm Co). Imagine o estrago que um produto com essa formulação produz num levantamento geoquímico. A aplicação desse produto numa lavoura acarreta uma contaminação ambiental severa pois nem todos os metais serão absorvidos pelos vegetais, e o resíduo será transportado para a rede hidrográfica ou se acumulará no solo. Isso produzirá uma grande elevação dos teores de fundo (background) desses metais, produzindo anomalias não significativas - não associadas a depósitos minerais.
Ess é um dos motivos da minha defesa da reanálise de amostras coletadas há muitos anos e guardadas com cuidado (veja uma das primeiras matérias do blog que trata desse assunto), pois elas refletem as condições ambientais anteriores à enorme expansão da atividade agrícola e a maciça aplicação de pesticidas, fertilizantes e corretivos, especialmente em regiões que naquela época eram remotas. Nas prateleiras desses arquivos de amostras, o ambiente de 30 anos atrás está virtualmente "congelado".

domingo, 6 de dezembro de 2009

As minas do Brasil e sua legislação

A Coleção Brasiliana foi editada originalmente pela Companhia Editora Nacional no período de 1931 a 1993, reunindo 415 volumes de autores brasileiros e estrangeiros que retrataram o país nos campos da História, Sociologia, Antropologia e História Natural, entre muitos outros. Agora, o projeto Brasiliana Eletrônica apresenta a versão digitalizada da Coleção Brasiliana. As obras foram revisadas, sua ortografia atualizada, e são acompanhadas de apresentações críticas e biografias dos autores, preparadas por grandes especialistas acadêmicos. Esse trabalho tem o apoio da FAPERJ, FINEP, UFRJ, Fundação Universitária José Bonifácio e Ministério da Educação

Dentre as obras disponíveis estão:
As minas do Brasil e sua legislação, escrita em 1938 pelo político e historiador Pandiá Calógeras, quando exercia o mandato de deputado federal por Minas Gerais, no início do século XX. Publicada em três volumes, o terceiro deles, denominado “Geologia econômica”, aborda a distribuição geográfica dos depósitos auríferos no território brasileiro, tendo sido o texto revisto e atualizado pelo geólogo Djalma Guimarães.
História das explorações científicas no Brasil (1941) escrito por Cândido de Melo Leitão e na Parte 1 descreve a história da exploração da costa,  as fronteiras, os rios e o planalto, o solo e suas riquezas e na Parte 2, expedições botânicas, zoologicas e entomológicas.

Recomendada para quem se interessa por história ou descobrir alvos exploratórios antigos e abandonados, o acesso a esses livros é muito simples http://brasiliana.com.br/

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Balanço de "quase final de ano"

Faz exatamente 130 dias que despretenciosamente iniciei esse blog. Nas horas de folga, postando uma matéria semanal, no máximo duas, "naquele tranquito de quem vai longe" como diz a gauchada.

Por isso, estou espantado com a contagem de 3.562 acessos o que dá uma média de 27,4 acessos/dia., Mais espantado ainda fiquei ao verificar que esses acessos são de visitantes de 31 países, majoritariamente do Brasil (89,1%), também de Portugal (2,5%) Estados Unidos (1,8%) e Peru (1,4%), mas ainda de países inesperados - pelo simples fato do blog ser escrito em português - como a Federação Russa (2 visitas), Republica Checa (3), Arábia Saudita (5), Eslováquia (1) e Japão (1).
A todos os visitantes frequentes ou eventuais, e aos fiéis "seguidores", agradeço os comentários enviados e espero, sem qualquer pretensão, postar matérias que agradem e cativem os visitantes, transformando os eventuais em frequentes.

sábado, 28 de novembro de 2009

A formação de um geoquímico de exploração

Durante o International Geochemical Exploration Symposium realizado em abril de 1968 na Colorado School of Mines em Denver, Colorado, aconteceu uma sessão painel sobre a Formação (Education) do Geoquímico de Exploração. Mesmo que esse evento tenha ocorrido há 40 anos, numa realidade econômica e social totalmente diversas de hoje, os depoimentos e os debates mostram que algumas questões permanecem muito atuais. Aí está um resumo do relato de 12 páginas dessa sessão painel.

Harold Bloom (Colorado School of Mines) - salientou a carência de geólogos especializados em técnicas geoquímicas seja nos países industrializados, em desenvolvimento e também nos países que estavam se formando. Num recente período de estudos na University of Adelaide ele encontrou um ambiente de pressão da indústria sobre a academia no sentido de formar especialistas. Alguns professores inexperientes no tema procuravam suprir as necessidades de formação de profissionais num país que estava experimentando um período de forte expansão das atividades de exploração.

Robert Boyle (Geological Survey of Canada) - os serviços geológicos têm importante papel a desempenhar : (1) fornecimento de dados sobre a abundância e caracteristicas de mingração dos elementos químicos; (2) desenvolvimento e testes de aplicação de técnicas de campo, análise e interpretação adequadas à prospecção geoquímica de depósitos minerais. Para atender a esses objetivos a formação de um profissional deve atender: (1) uma sólida formação geológica especialmente nos processos de formação de depósitos minerais; (2) conhecimento básico dos processos geoquímicos de dispersão e concentração dos elementos nas rochas, solos, águas naturais, gases e seres vivos; (3) conhecimento básico nas técnicas e levantamentos de prospecção geoquímica especialmente aqueles relacionados com a identificação de halos primários, halos de fuga e feições de dispersão secundária; (4) um conhecimento das técnicas analíticas suficiente para identificar suas potencialidades, aplicações e limitações; (5) um conhecimento estatístico adequado para tratamentos matemáticos e identificação de feições obtidas nos levantamentos geoquímicos.

Thomas Lovering (University of Utah) - deu ênfase no papel do USGS. O desenvolvimento de novas técnicas e a exploração de novas áreas onde a iniciativa privada não teria coragem de assumir os riscos. Haveria uma clara divisão entre vários profissionais como o geólogo de campo e o geoquímico trabalhando juntos, o quimico de laboratório capaz de processar centenas de amostras/dia e o quimico voltado à pesquisa de novas técnicas e para redução dos limites de detecção. O geoquímico de exploração seria um geólogo com muita experiência e que se interessou e foi autodidata nas aplicações da geoquímica ou quem foi forçado a se especializar pois seu chefe teria dito "Eu ouvi algumas coisas sobre essas técnicas e temos que testá-las." Estaria chegando o momento das universidades darem atenção e adaptarem seus currículos para preparar geoquímicos de exploração incluindo no currículo estatística , computação, técnicas e erros de amostragem.

R. Barker (Amax Exploration Company) - o ponto principal da formação de um geoquímico de exploração é a necessidade de pesquisas excitantes, interessantes e desafiadoras em exploração geoquímica. Ele deve ser um geólogo experiente em todos os aspectos da ciência geológica. Tem ocorrido uma ênfase completamente errônea e enganosa sobre a simplicidade das técnicas e da velocidade com que os dados são coletados e interpretados. Isso dá a entender que não há nada de ciência envolvido e que o processo de amostragem é apenas simples e tedioso. Um geoquímico de exploração deve ter bom conhecimento dos processos fisicos e quimicos envolvidos na hidrologia, pedologia, biologia, meteorologia e geomorfologia. O Prof. John Webb e seus colegas da Royal School of Mines mostraram ser possível formar profissionais com tais qualidades e o fato de nenhuma universidade americana ter programa semelhante é uma tragédia, e esta responsabilidade recai sobre cientistas e gerentes da indústria, universidades e governo.

J. Coppe (Newmont Mining Company) - um geoquímico de exploração empregado por uma empresa de mineração deve ser capaz de avaliar e aplicar a geoquímica em qualquer região, conduzir estudos geoquímicos orientativos para otimizar as técnicas de amostragem e determinar as melhores técnicas analíticas, dirigir o programa de amostragem e interpretar os resultados. Um embasamento completo em geologia é a mais essencial exigência para um geoquímico de exploração: ocorrência e formação de depósitos minerais, petrologia, estratigrafia, geologia estrutural, geomorfologia, processos do intemperismo, pedologia, hidrologia, quimica orgânica e inorgânica. Porém o mais importante professor de prospecção geoquímica é a experiência de campo na forma de trabalhos práticos e estudos supervisionados de pós graduação. A publicidade dada à exploração geoquímica enfatizou a simplicidade e o baixo custo dos métodos geoquímicos e criou uma imagem de pessoas sacudindo tubos de ensaio e produzindo belas cores. Muito pouca atenção foi dada à complexidade do ambiente natural e os inúmeros problemas da amostragem e análise. Com isso, disseminou-se a impressão que seria muito mais uma atividade de químicos que de geólogos, o que bloqueou os esforços daqueles que gostariam de colocar a exploração geoquímica nos currículos de geologia nas universidades, dificuldades que felizmente estão sendo superadas.

Howard Hawkes (consultor) - a grande questão é formar um profissional com todo conhecimento teórico e que irá praticá-lo apenas quando ingressar na indústria ou formar um profissional apenas com conhecimento aplicado que terá dificuldade de entender e colocar em prática os princípios e filosofias de novas tecnologias que surgirão no curso de sua carreira. "Eu conheço diversas empresas petroleiras que não querem pessoal especializado: Nos dê um fisico ou um químico que podemos transformá-lo no que precisamos." Existem quatro maneiras de especializar um profissional: cursos de treinamento na indústria; cursos de  treinamento especializado nas universidades; suporte de consultores especialistas; e finalmente a melhor maneira de aprender coisas que é a escola da experiência.

Alexei Beus (ONU) - a aplicação dos principios e métodos geoquimicos para a prospecção mineral devem ser considerados como um instrumento importante dos serviços geológicos em todo mundo. A experiência da última década mostrou que um  geoquímico de exploração deve ter um bom conhecimento dos ramos da geologia pertinentes à depósitos minerais e geomorfologia, assim como em técnicas analíticas. Os geoquímicos exploracionistas da URSS são geólogos com bom fundamento em geoquímica e treinados em química e análise espectral de rochas, minerais e minérios. Porém na URSS um geoquímico de exploração não se envolve com as rotinas analíticas que são realizadas por pessoal especializado e capaz de alta produção. Atualmente há um programa de treinamento em estatística para a avaliação e interpretação dos resultados.

W.Tupper (Carleton University) - os programas de educação e pesquisa na universidade começaram em 1958 e foram ofertados na graduação e no pós graduação como mestrado e doutorado. O problema mais sério é a falta de comunicação com a indústria e com o governo para identificar a qualificação dos profissionais no curto e no médio prazo. Enumerou algumas dificuldades na liberação de recursos de pesquisa e quando uma solicitação era negada não recebiam a justificativa. Muitas empresas ofereciam estágios de férias para estudantes de graduação e pós- o que dava um bom impulso na formação e na experiência. As empresas teriam mostrado pouco interesse nos cursos de geoquímica aplicada com duração de 10-15 dias ofertados pela Universidade.

John Webb (Imperial College) - com a sofisticação das técnicas analíticas, ocorreu um gradativo aumento da complexidade das técnicas de exploração geoquímica, mesmo que as técnicas de amostragem continuem bastante simples. A função da universidade é evidente, não só fornecendo os profissionais treinados como a indústria necessita, mas contribuindo com pesquisas para solucionar os problemas imediatos da indústria, e também agindo por antecipação começando agora pesquisas que terão resultados em 5 a 10 anos. "Concordo que não é adequado formar geoquímicos de exploração na graduação, mas não aceito a afirmação que geólogos devem adquirir a experiência necessária apenas exercendo a profissão nas empresas." Atualmente a diversidade das técnicas e o refinamento da interpretação são tais que exigem programas de treinamento em nível de pós graduação. No Imperial College, todos os estudantes e a equipe, exceto os químicos, são muito bons em fundamentos de geologia e têm preferência os que trabalharam alguns anos na indústria e retornaram à universidade para treinamento especializado ou pesquisa. Os ingredientes fundamentais do nosso Applied Geochemistry Research Group são a existência de 15 a 20 projetos simultâneos, o entusiasmo e energia de nosso grupo e o encorajamento a todos que prestem consultoria à indústria para que estejam mais próximos dos problemas a serem pesquisados e resolvidos e que sua remuneração esteja mais alinhada com os salários das empresas. Em resumo, o Applied Geochemistry Research Group está baseado no conceito que é nossa responsabilidade buscar e investigar todos os problemas onde a geoquímica pode auxiliar a comunidade.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Porque a geologia é diferente ?

A geologia difere das outras ciências experimentais na medida em que a maioria dos dados geológicos são fragmentários e derivados de processos naturais totalmente fora do controle do investigador. Quando um geólogo inspeciona um local particular da Terra, depara-se com uma situação singular desenvolvida ao longo do tempo e por uma quantidade de processos muito maior que ele tem condições de considerar. Ele não pode simplesmente apagar os processos naturais e substituí-los por condições de laboratório mais simples e controladas.
Além disso, ele verifica que os processos naturais atuaram no sentido de remover e apagar parte das evidências enquanto que as que permanecem, na sua maioria são inacessíveis ou profundamente soterradas, enquanto que as localizadas à superfície estão contaminadas por água, agentes climáticos e trabalhos de natureza humana.
Koch e Link (1970)

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Critérios para definição de anomalias

Encontrei num "sebo" o livro de Hawkes e Webb Geochemistry in mineral exploration. Com ele completei a "trilogia" Hawkes (1957), Hawkes e Web (1962) e Rose Hawkes e Webb (1979).
Ao comparar os conceitos estatísticos de definição de anomalias, observei que de maneira geral os três livros batem na mesma tecla.
"Para uma única população de valores que são distribuídos simetricamente o limiar para aquele material pode ser convencionalmente tomado como a média mais dois desvios padrões. Isso significa que apenas 1 em 40 amostas representativas do background deve ultrapassar o valor do limiar enquanto que apenas 1 em 667 amostras deve exceder o limiar de média mais três desvios padrões." (...) "Com pequenos grupos de dados com uma única população ou quando a distribuição estatística for irregular, provavelmente a melhor aproximação é obtida tomando o valor da mediana como o background e estimar o limiar como aquele valor que não é superado por não mais que 2,5% do total de observações ..."
Muita água passou por debaixo dessa ponte, e muito se avançou na interpretação dos dados geoquímicos e na seleção de limiares, especialmente com as elegantes interpretações das curvas de probabilidade propostas por Alastair James Sinclair. Os dois aplicativos desenvolvidos com a supervisão dele, na Universidade de Columbia Britanica, PPLOT e P-REZ, são muito ágeis e possibilitam modelar as curvas e isolar populações da mistura representada pelos dados de uma campanha de prospecção geoquímica.
Rose, Hawkes e Webb (1979) enumeram seis possibilidades para a identificação de anomalias: (1) comparação dos dados obtidos com dados publicados; (2) utilização de histogramas para separar populações backgound e anômalas; (3) calculo do limiar a partir da média mais 2 e 3 desvios padrões; (4) uso dos gráficos de probabilidade para separar as populações misturadas; (5) reconhecimento de nuvens de amostras de teores elevados em um mapa de distribuição de valores; (6) comparação com os resultados de um estudo geoquímico orientativo.
Mas, um lembrete que eu considero da maior utilidade e com pleno fundamento: muito embora haja uma grande quantidade de técnicas de tratamento, análise e representação de dados geoquímicos, nenhum deles será capaz de fornecer uma interpretação. Uma análise matemática pura jamais substituirá o talento de uma interpretação subjetiva de um geólogo de exploração. Uma interpretação confiável exige uma combinação de conhecimento e de experiência geológica e geoquímica.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Falácias - filosofia no nosso cotidiano

Uma falácia é um argumento logicamente inconsistente, sem fundamento, inválido ou falho na capacidade de provar eficazmente o que alega. Argumentos que se destinam à persuasão podem parecer convincentes para grande parte do público apesar de conterem falácias, mas não deixam de ser falsos por causa disso. Reconhecer as falácias é por vezes difícil. Os argumentos falaciosos podem ter validade emocional, íntima, psicológica ou emotiva, mas não validade lógica (Fonte: Wikipédia, a enciclopédia livre).
O exame das falácias é interessante pois desperta a nossa atenção para deslizes que cometemos no dia-a-dia tanto na argumentação oral, quano na redação de textos. Muito cuidado com elas !
Da enorme relação de falácias, pincei algumas e fiz uma adaptação livre dos exemplos

Argumentum ad antiquitatem (Argumento de antiguidade ou tradição): afirmar que algo é verdadeiro ou bom só porque é antigo ou "sempre foi assim".
Ex: "Há muito tempo que em prospecção geoquímica usam a fração <80 mesh e dizem que é a melhor, então isso deve ser verdade ."

Argumentum ad hominem (Ataque ao argumentador): em vez de o argumentador provar a falsidade do enunciado, ele ataca a pessoa que fez o enunciado.
Ex: "Se foi um geofísico que disse isso, certamente é falso".

Argumentum ad ignorantiam (Argumento da Ignorância): ocorre quando algo é considerado verdadeiro simplesmente porque não foi provado que é falso (ou provar que algo é falso por não haver provas de que seja verdade). Note que é diferente do princípio científico de se considerar falso até que seja provado que é verdadeiro.
Ex: "Existe um corpo de minério debaixo daquela montanha, pois nunca provaram o contrário"

Non sequitur (Não segue): tipo de falácia na qual a conclusão não se sustenta nas premissas. Há uma violação da coerência textual.
Ex: "Que nome complicado tem este consultor. Deve saber tudo de geoquímica ! "

Argumentum ad Baculum (Apelo à Força): utilização de algum tipo de privilégio, força, poder ou ameaça para impor a conclusão
Ex: "Acredite na geoquímica, senão todos os teus projetos serão um fracasso."
Ex."Acredite no que eu digo, meu jovem e não se esqueça de quem paga o seu salário"

Argumentum ad populum (Apelo ao Povo): é a tentativa de ganhar a causa por apelar a uma grande quantidade de pessoas.
Ex: "Inúmeras pessoas usam esse laboratório, portanto, ele produz análises de melhor qualidade."

Argumentum ad Verecundiam (Apelo à autoridade) ou Magister Dixit (Meu mestre disse): argumentação baseada no apelo a alguma autoridade reconhecida para comprovar a premissa.
Ex: "Se o meu gerente disse isto, então é verdade."

Generalização Apressada (Falsa indução): ocorre quando uma regra específica é atribuída ao caso genérico.
Ex: "Meu amostrador coletou as amostras de maneira errada. Logo todos os amostradores são uns incompetentes. "

Falácia de Composição (Tomar o todo pela parte): é o fato de concluir que uma propriedade das partes deve ser aplicada ao todo.
Ex: "Todas as amostras foram bem coletadas; logo, o nosso projeto será um sucesso."

Falácias tipo "A" baseado em "B" (Conclusão Sofismática) : dois fatos são colocados como similares por serem similares a um terceiro fato.
1."A prospecção geoquímica é baseada em princípios científicos."
2."A fisiologia dos macacos é baseada em princípios científicos."
3."Logo a prospecção geoquímica é similar à fisiologia do macacos."

XII Congresso Brasileiro de Geoquímica

Recebi do Prof. Jorge de Lena da UFOP e membro da comissão organizadora do XII CBGq, algumas foto da cerimônia de abertura do XII CBGq e do VII ISEG. A festividade aconteceu no dia 18/10/2009 no Centro de Artes e Convenções da UFOP, no Parque Metalúrgico em Ouro Preto.





A mesa diretora dos trabalhos foi constituída (da esquerda para a direita) por: Cristóvam Paes de Oliveira – Presidente da Fundação Gorceix; Issamu Endo – Chefe do Dep. de Geologia da Escola de Minas da UFOP; Ronald de Carvalho Guerra – Secretário de Meio Ambiente de Ouro Preto; Andre de Barros Cota – Pró-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa da UFOP; Carlos Siqueira Bandeira de Mello – Presidente da SBGq; Claudio Vieira Dutra – Presidente de Honra do XII CBGq/VIII ISEG; José Geraldo Arantes de Azevedo Brito – Diretor da Escola de Minas da UFOP; Eduardo Ferreira da Silva – Representante da SBGq na Europa; Hubert Mathias Peter Roeser – Presidente do XII CBGq/VIII ISEG.


O Dr. Cláudio Vieira Dutra, Presidente de Honra do XII CBGq/VIII ISEG e o 1º Presidente da Sociedade Brasileira de Geoqímica recebeu uma justíssima homenagem da Comissão Organizadora. Na foto ao lado, o Presidente da SBGq, Carlos Siqueira Bandeira de Mello, faz a leitura da placa de prata pouco antes de entregá-la ao homengeado. O Dr. Cláudio Dutra foi um dos mais importantes e ativos geoquímicos do Brasil, tendo participado da equipe de analistas que trabalhou com Djalma Guimarães e depois, já na iniciativa privada, foi por muitos anos o  responsável pelo laboratório geoquímico da Geosol em Belo Horizonte. A homenagem  e o respeito desse blog ao Dr. Cláudio, um dos grandes pesonagens da geoquímica do Brasil

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Prospecção geoquímica, quantas bobagens se cometem em teu nome !

Nesses quase 35 anos que trabalho em projetos de prospecção geoquímica, para diversas empresas privadas e estatais e nos mais diversos lugares e ambientes geológicos, isso me incomoda.
Quando uma companhia necessita de um serviço de prospecção geofísica, contrata uma empresa especializada que conta com uma bela aeronave, equipamentos adequados e calibrados, pessoal de campo treinado e pelo menos um geólogo especializado ou geofísico para o planejamento, supervisão e acompanhamento. Devido a enorme quantidade de dados que são coletados, o processamento e o tratamento exige recursos computacionais sofisticados. Por esse motivo, normalmente os resultados correspondem aos propósitos iniciais do projeto.
Porém, e infelizmente, a "coisa" muda de figura quando uma companhia planeja um serviço de prospecção geoquímica ! Após o planejamento das estações de amostragem, vem a fase de coleta de centenas ou até milhares de amostras com as coordenadas determinadas com GPS com excelente precisão. Essas amostras são enviadas a um laboratório para determinação de dezenas de elementos químicos por ICP-MS com sensibilidade de partes por milhão ou até por bilhão. O responsável pelo projeto recebe os resultados do laboratório por internet de alta velocidade, os quais serão automatica e instantaneamente carregados em um banco de dados sofisticado e com fortes controles de segurança. Pronto ! Está gerado um enorme banco de dados, resultado de um esforço gigantesco de dezenas de pessoas, e uma grande quantidade de recursos financeiros, materiais e de tempo. Muito bem ! Hora de arregaçar as mangas e partir para a interpretação dos dados.
Posso antever três cenários, para que o leitor tire as suas conclusões:
Cenário 1 - o geólogo responsável pelo projeto passa os olhos pelos boletins analíticos - porque não entendo nem acredito em computadores, softwares e bancos de dados - e com uma caneta vermelha,  marca os valores do elemento de interesse que saltam aos olhos e que a seu arbítrio considera anômalos.
Cenário 2 - o geólogo responsável pelo projeto usa uma planilha eletrônica para calcular a média e o desvio padrão e com base nesses estimadores, estabelece anomalias de terceira, segunda e primeira ordens dos elementos de interesse.
Cenário 3 - o geólogo responsável pelo projeto, examina cuidadosamente os valores de cada elemento analisado, constrói e analisa a tabela de frequências, histograma e gráfico de probabilidade, identifica e separa populações que podem representar diferentes litologias ou então discriminar áreas estéreis das mineralizadas, conseguindo assim caracterizar os valores anômalos com precisão quase cirúrgica, compatível com o cuidado com que os dados foram produzidos.
É evidente que os valores mais altos serão sempre os que merecem o nosso interesse, independentemente da técnica estatistica ou empírica que adotarmos. Mas porque desprezar os valores suavemente elevados que circundam esses teores excepcionais, formando grupos de amostras capazes de definir lineamentos, estruturas ou verdadeiros halos geoquímicos sobre áreas de interesse, que se tratadas de maneira mais expedita poderiam ser expressas no mapa geoquímico como uma ou duas bolinhas vermelhas isoladas ?
Além disso é importante lembrar que o sinal geoquímico de depósitos encobertos pode se mostrar não apenas na forma de teores extremos de elementos isolados, mas principalmente na forma de associações geoquímicas de elementos farejadores e/ou indicadores, todos em teores sutilmente discrepantes do fundo geoquímico regional.

domingo, 1 de novembro de 2009

De um pequeno ponto vermelho até ...


Há poucos dias o satélite Swift detectou um pequeno ponto que está sendo considerado o ponto mais distante do Universo jamais localizado. Ele está a 13 bilhões de anos luz da Terra, e formou-se da explosão de uma estrela que aconteceu apenas 400.000 anos após o BigBang.
A história do Universo, com pequenas variações conceituais,  admite que no início apenas energia era o "material" constituinte do Universo e espantosamente diluída. Com os fenômenos de aglutinação, contração, do enorme aumento da densidade das massas estelares, novos elementos mais pesados foram se formando. Reações termonucleares de queima de H com temperaturas de até 107 K formam He que permaneceria no núcleo. O núcleo se contrai por atração gravitacional e a temperatura aumenta para cerca de 108 K. Nesse processo o He dá origem ao C, este ao O, ao Ne, ao Mg, ao Si e outros elementos de massa mais elevada. Com a expansão explosiva que ocorre ao final do ciclo de formação das estrelas, esses elementos mais densos se disseminaram pelo Universo. Lembre que estamos falando de tempo em escala astronômica e não geológica !
Atualmente 99,3% em peso dos materiais geológicos expostos à superficie terrestre são compostos por apenas 8 elementos: O, Si, Al, Fe, Mg, Ca, Na e K. Com isso, para os outros 84 elementos naturais resta apenas 0,7% . Nessa pequena proporção estão os elementos que interessam à prospecção geoquímica como S, As, Sb, Bi, Cu, Pb, Zn, Pt, Pd, Au e tantos outros
De uma maneira arbitrária, os elementos químicos podem ser categorizados segundo a sua abundância nas rochas (clarke) da seguinte maneira. Os elementos maiores como Mg, K, Ti, Fe, Al e Si estão presentes em teores maiores que 1.000 ppm e são expressos normalmente em %. Elementos menores como Ba, Sr, Zr e F, estão presentes na faixa entre 100 e 1.000 ppm. Elementos traço como Be, Mo, Ge, Cu, Pb, As e a maioria dos ETR (elementos Terras Raras) se apresentam entre 1 e 100 ppm. Elementos ultra-traço como Au, Pt, Pd e Hg têm teores expressos em ppb ou ppt.
Essa divisão dos elementos, simplista e arbitrária serve para mostrar que os elementos que nos interessam em prospecção geoquímica estão presentes em pequeníssimas quantidades e que qualquer erro de procedimento durante a coleta, embalagem, transporte, preparação e análise podem contaminar  de maneira grave qualquer amostra para prospecção geoquímica.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Curso de Prospecção Geoquímica


Aconteceu no sábado dia 17/10, na Escola de Minas de Ouro Preto, antes do 12 Congresso Brasileiro de Geoquímica. O curso foi dividido em dois módulos. Pela manhã, Carlos Siqueira Bandeira de Mello (o segundo da esquerda para a direita) do CENPES/Petrobrás apresentou as tecnologias utilizadas na prospecção geoquímica de depósitos de óleo e gás. À tarde, eu (o último de pé à direita), apresentei as técnicas geoquímicas utilizadas na prospecção de depósitos minerais metálicos. Uma turma heterogênea com 19 alunos, muitos graduandos de geologia da UFOP, mas também do curso de química da Univ. Viçosa, e geólogos de empresas. Ao final do curso, lá pelas 18 horas, foram sorteados seis exemplares do livro de Prospecção Geoquímica de Depósitos Minerais Metálicos, Não Metálicos, Óleo e Gás, editado pela SBGq (veja matéria postada nesse blog).

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Mudou o mundo ou mudei eu ?

Pesquisando na Internet, consegui uma cópia do vol III do Bulletin nº 4 do Territory of Alaska Department of Mines, editado em Juneau em Abril/1955. Na página 3 há uma notícia sobre o segundo curso de prospecção geoquímica que aconteceria a partir de 9 de maio na University of Alaska School of Mines. Seria um curso de duas semanas corridas e seria ministrado por Mark Leo Anthony, instrutor de cursos de extensão em Mineração e pelo Dr. N. R. Mukherjee, Professor de Metalurgia. O programa incluia amostragem de solo e água e os estudantes preparariam seus próprios kits de campo (conjunto de reagentes para testes colorimétricos rápidos). O curso era destinado a prospectores experientes e que tivessem concluído o mini-curso de Mineração e o curso de extensão em Mineração. Todos os químicos e analistas do Territory of Alaska Dept. of Mines estavam matriculados para que depois pudessem dar o suporte aos prospectores no preparo das soluções e reagentes para os novos kits. A inscrição tinha um custo de $10.
Como resultado do primeiro curso de prospecção geoquímica ministrado na mesma Universidade no outono de 1954, havia se formado um ativo grupo de 14 prospectores autodenominado de Geochemical Prospectors Club. Eles se encontravam todas as noites das quartas-feiras para discutir, trocar experiências e aprimorar seus procedimentos geoquímicos. Esse era considerado o mais avançado e sério clube de prospectores do Alaska e seus membros estariam no ponto de fazer grandes descobertas já no verão de 1955
Essa notícia me causou surpresa ao saber que em 1955 no Alaska capacitava-se prospectores nas técnicas de prospecção geoquímica, e que existiam diversos clubes de prospectores que reuniam-se semanalmente para trocar experiências.  Infelizmente no Brasil do século XXI, geólogos e técnicos de mineração e de geologia são graduados sem nunca terem coletado sequer uma amostra para prospecção geoquímica.
Como comentário, aproveito o que um dia escreveu Millôr Fernandes "Mudou o mundo ou mudei eu ?"

domingo, 11 de outubro de 2009

XII Congresso Brasileiro de Geologia

A partir do dia 17 de outubro, acontecerá em Ouro Preto o XII Congresso Brasleiro de Geoquímica.
Não acredito que você não sabia disso !
Acesse imediatamente www.12cbgq.ufop.br/12cbgq/index_br.html. Ainda há tempo !
No domingo, dia 18, a cerimônia de abertura e depois durante a semana, uma programação que abrange todos os aspectos da geoquímica.
Estarei por lá e no retorno postarei alguns textos e fotos.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Garçom, me dá uma média !

Média ! Uma medida estatística simples, útil, muito fácil de calcular, mas também a responsável involuntária por tantos mal-entendidos e fracassos. Numa situação especial onde há uma homogeneidade nas medidas, sem variações bruscas, elá é uma estimativa muito boa da média dos valores. Porém quando ocorrem bruscas variações ou medidas muito discrepantes, a média pode se transformar num veneno mortal. Em Porto Alegre, dizem que a profundidade média do lago (ou rio) Guaíba é de 1,20 m, mas ninguém se atreve a atravessá-lo a pé ! Essa impossibilidade é devida ao desvio padrão, materializado nesse caso num canal de navegação com cerca de 10 metros de profundidade. A simples existência desse canal profundo provoca uma forte assimetria nas medidas da profundidade das águas e faz com que a média não mereça a mínima credibilidade de quem quiser cruzar caminhando o lago Guaíba, sem usar uma bóia.
Na década de 1950, Ahrens descreveu o comportamento dos teores dos elementos menores e traço em materiais geológicos, mostrando seu caráter assimétrico. Depois dele, dezenas de autores publicaram centenas de artigos e livros sobre essa questão - a assimetria dos dados geoquímicos. Assim, sendo eles assimétricos, não faz nenhum sentido aplicar-lhes uma medida estatística concebida para distribuições simétricas.
Porque eu insisto em postar tantos textos sobre essa questão ? É porque por desconhecimento, pressa ou até preguiça, muitos geólogos usam a média e o desvio padrão para descrever dados geoquímicos e caracterizar anomalias geoquímicas sem ter se preocupado antes de se certificar se essa abordagem é a adequada.
Para isso só há uma alternativa: conheça os seus dados geoquímicos. Esprema-os até conhecê-los profundamente. O jornalista e economista Joelmir Betting disse uma vez que "Estatística é a arte de torturar os dados até que eles confessem." Concordo com ele.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Vão-se os anéis, ficam os dedos!

Duas recentes e espetaculares descobertas científicas nos espantaram nesses últimos dias: mais um anel em Saturno e o prêmio Nobel de medicina pela descoberta da telomerase. Apesar das diferentes escalas de observação, a primeira em milhares de anos-luz e a outra em escala de mili-micrômetros, ambas são o resultado de dezenas de anos de pesquisas e me parece que têm importantes significados.
O primeiro está em demonstrar o erro grosseiro de supor que tudo está descoberto, conhecido e controlado.
O segundo é demonstrar que ciência não se faz sem rígidos controles, paciência e eterna crítica dos procedimentos e resultados.
O terceiro é a prova cabal de que novas descobertas científicas só serão feitas com uso e aplicação de novas técnicas de investigação, com maior qualidade, resolução, precisão e exatidão.
Isso se aplica perfeitamente na exploração geoquímica, pois desde suas primeiras aplicações no início do século XX até a atualidade do conhecimento, "muita água passou por debaixo da ponte".
Frações granulométricas, técnicas de ataque ou digestão, instrumental analítico, o criação do computador pessoal, os aplicativos estatísticos e de cartografia digital e assim por diante, fazem parte do instrumental indispensável do geoquímico para identificar e caracterizar com precisão seus alvos de interesse. Todos essas ferramentas foram desenvolvidas ao longo de um longo período de tempo e resultam da atuação de diversos ramos da ciência pura e aplicada numa teia inimaginável de pessoas, instituições e recursos financeiros. Por isso que o processo de investigação científica é lento, miseravelmente lento.
Para descrever o processo da descoberta científica podemos usar esse brilhante pensamento do teatrólogo Samuel Beckett " Tente de novo. Fracasse de novo. Fracasse melhor!"
Como toda aplicação da ciência, a exploração geoquímica necessita de uma mente aberta e sempre disposta a questionar resultados, positivos e negativos, e principalmente experimentar novas metodologias.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

As Leis de Murphy da Vulcanologia


As Leis de Murphy de Vulcanologia foram compiladas numa tentativa de produzir um conjunto de regras que ajudem a combater as leis da natureza. A atividade vulcânica é imprevisível e é bem explicada pelas Leis de Murphy. A medida que fornecem alívio cômico, também esperamos que as Leis de Murphy ajudem no planejamento sério da segurança (John Seach http://www.volcanolive.com/murphy.html)

A Lei de Murphy:

Se qualquer coisa puder dar errado, vai dar errado e da maneira a causar mais danos.

Corolários:

Nada é tão fácil quanto parece.

Tudo leva muito mais tempo que você pensa.

Por si mesmas, as coisas tendem a ir de mal a pior.

Toda solução cria novos problemas.

A Primeira Lei de Seach de Vulcanologia:

Você perderá a erupção.

Corolário um: Se dois vulcões estiverem a ponto de entrar em erupção, você irá para o errado.

Corolário dois: Se um vulcão está a ponto de entrar em erupção, um dia você chegará lá muito tarde ou no outro dia sairá de lá muito cedo .

Corolário três: A erupção acontecerá quando você estiver trocando as baterias da câmera.

Corolário quatro: O vulcão entrará em erupção quando estiver encoberto por nuvens.

Corolário cinco: Um dia você tem que dormir.

O Paradoxo de Seach:

Uma redução na atividade eruptiva aumenta o risco.

Corolário um: Cuidado com um vulcão quieto.

O Segundo Paradoxo de Seach:

Chegar ao vulcão é mais perigoso que o próprio.

O Terceiro Paradoxo de Seach:

A organização com o maior orçamento, será a última a informar a erupção.

A Primeira Lei de Seach de Realização:

O número de erupções observadas, é inversamente proporcional ao número de reuniões assistidas.

A Segunda Lei de Seach de Realização:

Quanto mais dinheiro você tem, menos você alcança.

O Dilema de Evacuação de Seach:

Você está fudido se faz, e fudido se não faz.

O Paradoxo de Evacuação de Seach:

Pessoas que são evacuadas, perderão o evento mais excitante de suas vidas.

A Regra de Fagin.

Compreensão tardia é uma ciência exata.

As Premissas Lógicas de Colvard:

Todas as probabilidades são 50/50. O vulcão explodirá ou não.

A Lei de Seay:

Em uma expedição nada acontece como planejado.

A Segunda Lei de Sodd:

Mais cedo ou mais tarde, o pior conjunto de circunstâncias deve acontecer.

O comentário de Seach na Lei de Sodd:

Qualquer sistema de alerta de vulcões deve ser projetado para resistir a Segunda Lei de Sodd.

A Lei de Rudin

Em crises, a maioria das pessoas escolherá a pior ação possível.

A sétima exceção de Zumurgy para a Lei de Murphy:

Quando chove, escorre.

A Lei de Shedenhelm de Backpacking:

Todas as trilhas têm mais seções em aclive que em nível ou declive.

Primeira Lei da viagem:

Sempre leva muito mais tempo para ir que para voltar.

Primeira lei de Finagles:

Se um experimento funcionar, algo deu errado.

Lei de Williams e de Holland:

Se forem coletados dados suficientes, qualquer coisa pode ser provada por métodos estatísticos.

A Lei de Hiram:

Se você consultar muitos peritos, você pode confirmar qualquer opinião.

A Lei de Murphy de Pesquisa

Pesquisa suficiente tenderá a apoiar a sua teoria.

Lei de Young

Todas as grandes descobertas são feitas por engano.

As Regras de Spark do Volcanólogo

Se esforce para parecer tremendamente importante.

Tente ser visto com pessoas importantes.

Fale com autoridade; porém só exponha fatos óbvios e provados.

Dê todas as ordens verbalmente. Nunca escreva qualquer coisa que possa ser usada contra você.

A Lei de Trueman

Se você não puder convencê-los, confunda-os com ciência.

A Máxima de Merkin:

Quando estiver em dúvida, prediga que há tendência de continuar.

Regra de Mars:

Um perito é qualquer um de outra cidade.

A Primeira Lei de Clarke:

Quando um cientista renomado e mais velho disser que algo é possível, ele certamente estará com a razão. Quando ele disser que algo é impossível, provavelmente está errado.

A Segunda Lei de Clarke:

O único modo para descobrir os limites do possível é ir além deles no impossível.

Lei de Jones dos Museus:

O espécime mais interessante não será etiquetado.

O Corolário de Lerman:

Você nunca receberá tempo ou dinheiro suficientes para realizar o trabalho de campo.

A constante de Murphy:

Um objeto será danificado em proporção direta do seu valor.

O Preceito de Jaffe:

Há algumas coisas sobre um vulcão que é impossível saber - mas não é possível saber estas coisas.

A Última Lei:

Por definição, quando você estiver investigando o desconhecido, você não sabe o que você achará.

A Lei de Ken:

Uma partícula voadora sempre buscará o olho mais próximo.

A Lei de Biondi:

Se seu projeto não funcionar, procure a parte que você pensou que não fosse importante.

A Primeira Lei de Berra:

Você pode observar muito só olhando.

O Paradoxo de Silberman:

Se a Lei de Murphy pode dar errado ,vai.

sábado, 26 de setembro de 2009

Grafoscopia ou papiloscopia geoquímica ?

As diversas classificações existentes para tipos e modelos de depósitos minerais são incapazes de sintetizar a complexidade das associações entre elementos em cada corpo de minério.

Por sua singularidade e exclusividade, para essa associação entre elementos maiores, menores, traço e ultra-traço em um depósito mineral me parece que a expressão "geochemical fingerprint" é muito mais precisa que a "assinatura geoquímica" que adotamos.

A complexidade dessa associação de elementos se dá não só por fatores muito gerais e comuns que caracterizam um modelo de depósito mas também por fatores muito particulares à cada corpo ou jazimento, como por exemplo o resultado da interação dos fluidos mineralizadores com as encaixantes, ou a atuação do metamorfismo sobre a mineralização.

O avanço espetacular que as técnicas analíticas sofreram nos últimos vinte anos tanto na quantidade de elementos determinados quanto na sensibilidade, precisão e exatidão dos resultados, possibilitaram que a investigação dessas associações se aprofundasse, já que passaram a ser considerados teores expressos em %, ppm, ppb e até ppt.

A construção de funções aditivas ou multiplicativas refletindo as associações elementares de depósitos conhecidos, configura um enorme avanço nas técnicas de prospecção geoquímica antes baseada exclusivamente no estudo dos halos e trends de dispersão de elementos isolados. Com essas funções, o traçado dos perfis geoquímicos fica muito menos serrilhado já que o sinal geoquímico é menos oscilante e os halos de dispersão muito mais estáveis e longos.

Existem porém algumas armadilhas nesse processo, relacionadas às diferenças de escalas e amplitudes de medida e à distribuição estatística das variáveis envolvidas. É fácil imaginar que faz pouco sentido somar os teores de um elemento com distribuição normal com os de outro de distribuição log-normal, ou multiplicar os teores de um que varia ao redor de 2500 ppm com os de outro que se situa na faixa dos 15 ppb. Mas, não se desespere ! Há soluções relativamente simples para contornar essas dificuldades. Eu já fiz diversas experiências e aplicações de funções aditivas e multiplicativas em ambientes semi-áridos, tropicais e temperados e sempre com resultados muito positivos.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Série "Memórias Geoquímicas" - Conhecer e respeitar o passado para entender o presente e planejar o futuro

Quando eu estava escrevendo o Capítulo 1 do Livro Prospecção Geoquímica de Depósitos Minerais Metálicos, Não Metálicos, Óleo e Gás, escrevi ao meu caro Prof. Manuel Serrano Pinto da Universidade de Aveiro, Portugal solicitando informações sobre os primeiros trabalhos realizados em Angola. Ele, sempre disposto a colaborar, fez contato com o Prof. Bernardo José Ferreira Reis que enviou muitas informações que infelizmente não tivemos tempo para incluir no livro. É um material muito interessante e rico, não só pela relação de referências bibliográficas mas também por mostrar que já em 1966, muito adiante de outros países mais desenvolvidos, já eram elaboradas cartas geoquímicas em Angola. Publicar esse material é uma reparação dessa falha involuntária e uma homenagem a todos os pesquisadores citados e que realizaram tantos e tão importantes trabalhos em Angola.

Em nome dos leitores desse blog, agradeço muito aos prezados Manuel Serrano Pinto e ao Bernardo Reis pela valiosa contribuição ao resgate da memória da prospecção geoquímica nos países de língua portuguesa.

(...) após diversas pesquisas posso referir que quanto ao meu conhecimento, as pesquisas geoquímicas nos quimberlitos tiveram lugar a partir de 1950 aproximadamente, sob a orientação de C. Fiersmans (Belga). Um dos trabalhos que conheço mas não posso precisar a verdadeira data foi Jedwab, J. no Congo Belga, à volta de 1950/52. este mesmo investigaddor dedicou-se `prospecção geoquímica no Congo Belga, na região de Kassai, tendo publicado um trabalho em 1959 “Prospection géochimique de kimberlite diamantifére au Congo Belge” (Bull. de la Soc. Belge de Géol; de Paléon. Et d’Hyd. tome LXVII, pp 404-417.

Na Lunda, deve-se ao Eugénio Correia o lançamento da prospecção geoquímica nos quimberlitos, seguindo a pista deixada por Jedwab e Fiersmans (Belgas), tendo publicado o primeiro trabalho no Boletim nº 11 (janeiro/junho) do Serviço de Geologia e Minas.

Penso que o Eugenio Correia montou o Laboratório de Geoquímica à volta de 1963 havendo imensos trabalhos inéditos realizados e publicados internamente até 1975, que devo ter em meu arquivo, mas de momento exigiria um grande esforço para os localizar, dentro de toda documentação que tenho. Mesmo assim envio-te uma listagem que encontrei (só até 1966, inéditos).

1. A. Rodrigues. Carta Geoquímica da região de Mussolegi/Luana. Rel Geologia. Julho de 1966.

2. Arlindo Saraiva. Propsecção geoquímica do tributário do Ribeiro Cariué/Luachimo e Sector Muquita/Sombo. Rel Geologia, Maio de 1966

3. Baltazar Rodrigues. Carta geoquímica do interflúvio Sequeje/Cambatxe, afluente do Quissema/Cuango. Rel. Geologia, Junho de 1966.

4. Bernardo Reis. Carta geoquímica da região de Cassupala, Luachimo e Sector Muquita/Sombo. Rel. Geologia, Julho de 1966.

5. Bernardo Reis. Preparação de padrões para dosagem do níquel por cromatografia. Rel. Geologia, Julho de 1966.

6. Bernardo Reis. Carta geoquímica do quimberlito do Camuanzanza. Rel. Geologia, Dezembro de 1966

7. Eugenio Correia. Ensaios preliminares de prospecção geoquímica (Níquel) nos quimberlitos de Caixepa, Muenze e Camuvuma. Rel Geologia, Abril de 1964.

8. Eugenio Correia. Ensaios preliminares de prospecção geoquímica (Cromo) nos quimberlito de Caixepa. Rel Geologia, Maio de 1964.

9. Eugenio Correia. Ensaios Pormenorização da zona de concentrações anômalas de Ni, assinaladas no único perfil geoquímico da Linha 3 do ribeiro Caixepa. Rel Geologia, Julho de 1964.

10 Eugenio Correia. Ensaios de prospecção geoquímica do Ni em quimberlitos da Bacia do Luachimo: Capombo, Cariué e Cambuage. Rel Geologia, Setembro de 1964.

11. J. Jedwab. Prospection géochimique de kimberlite diamantifére au Congo Belge. Bull. de la Soc. Belge de Géol; de Paléon. Et d’Hyd. tome. LXVII, pp 404-417.

12. A. Monforte. Carta geoquímica da região do Mussolegi. Rel. Geologia, Março de 1966.

13. A. Monforte. Carta geoquímica do Luo/Chicapa. Rel. Geologia, Junho de 1966.

Há vários trabahos de autoria (inéditos): Eugênio Correia, A. Monforte, Balthazar Rodrigues, A. Rodrigues, Recharto Caldeira, Xambre, Bernardo Reis, Acúrsio Parra, Rui Menezes, Ricardo Figueiredo,m etc.

No Boletim nº 25 dos Serviços de Geologia e Minas, existe um trabalho do Acúrsio Parra “Prospecção geoquímica de Quimberlitos nas Bacias Fluviais do Lufulé e do Cacuilo”, p 35-47.

(...)

Bernardo José Ferreira Reis

Braga, Portugal, 05 de fevereiro de 2007

sábado, 19 de setembro de 2009

Aquecimento global


Recebi de um amigo de Porto Alegre o anúncio-convite para o curso de cartun e charge do Santiago um dos mais antigos e produtivos chargistas do Rio Grande do Sul. Produtivo e perspicaz tem um traço bem característico. O convite está ilustrado com uma charge excelente sobre o aquecimento global, principalmente por ter como protagonista uma criança que representa o futuro do planeta e a geração que no curto-médio prazo sofrerá os efeitos desse problema. O aquecimento global é um fato inquestonável que parece ter um forte componente natural e uma também forte contribuição de emissões de gases e particulados e de calor antropogerados.
Por falar nisso, tenho criticado muito o uso dos termos antropogênico e geogênico com sentido totalmente errado. Etimologicamente esses termos significam a geração do homem (antropo gênese) e a geração da Terra (geo gênese) mas sido corrente e frequentemente usados para expressar a idéia de algo produzido pela ação do homem ou de algo produzido a partir do fundo geológico, o que me parece totalmente equivocado. O correto seria antropogerado e geogerado. Concordo que são palavras horríveis, mas infelizmente me parecem as formas corretas.

Para mais informações sobre o curso do Santiago escreva para luciano.klockner@pucrs.br

Série "Memórias Geoquímicas" - Conhecer e respeitar o passado para entender o presente e planejar o futuro

Último capítulo - Continuação do Capítulo 4 postado em 15/9/21009

Capítulo 5 - Terceira fase do projeto - Estudo regional: objetivos perseguidos. hipóteses de trabalho

O estudo regional, como se deixou transparecer nos parágrafos anteriores, foi o de verificar ou delinear eventual província geoquímica de cobre e/ou outros metais e identificar alvos geoquímicos merecedores de estudos mais detalhados: geofísica (possivelmente gravimetria quando houver corpos máficos associados e presença de magnetita e grafita em outros tipos de rocha) e sondagens.

5.1 HIPÓTESES DE TRABALHO LEVANTADAS

A - Se fosse delimitada uma província geoquímica de cobre no vale do Curaçá, as jazidas de cobre eventualmente delineadas seriam do mesmo tipo das de Caraíba, isto é, cobre associado a rochas máficas e ultramáficas. Entretanto, não havia elementos (nos anos 1960 e 1970) para se assegurar que essa hipótese iria ser confirmada.

B - Os resultados encontrados em Caraíba se aplicariam em escala regional, do ponto de vista de mobilidade relativa, dos elementos analisados, da associação geoquímica, da intensidade e dimensão dos halos geoquímicos de cada alvo ou ocorrência. Este pressuposto encontra, porém sérias limitações: profundidade do corpo de minério em relação à superfície, que pode ser sub-aflorante ou não; superfícies de falha cortando os corpos de minério em profundidade e atingindo a superfície (produzindo vazamento de anomalia); elementos químicos presentes que podem interferir nos resultados analíticos; dimensão do corpo mineralizado. Logo, o intervalo de amostragem (1.000x500 metros) indicaria preferencialmente corpos minerais nas condições gerais do que existe em Caraíba, mas poderia deixar de fora importantes mineralizações, por exemplo, por causa da profundidade em que se encontram.

C - A mineralização teria filiação máfica/ultramáfica, em corpos que teriam se formado antes ou durante o intenso metamorfismo regional, que envolve anatexia com reações químicas entre as rochas e assim os halos geoquímicos primários (condições de elevadas pressão e temperatura) teriam caráter epigenético (dispersão por efeito do metamorfismo).

D - O grau de metamorfismo seria essencialmente o mesmo em toda a região do vale do Curaçá, pois se não o fosse, invalidaria o intervalo de amostragem adotado (1.000x500m), que produziu resultados positivo.

E - Considerando o solo como sendo residual em toda a região do vale do Curaçá, a dispersão dos elementos no ambiente geoquímico secundário (solos) revelaria a mesma configuração da dispersão desses mesmos elementos químicos no ambiente geoquímico primário (rochas).

F - Se a gênese admitida como sendo máfica/ultramáfica não se confirmasse, muitas jazidas poderiam ser perdidas, isto é, não seriam identificadas como jazidas potenciais, inclusive porque em Caraíba as rochas máficas/ultramáficas originaram solos ricos em montmorillonita, o que tem o mérito de realçar as anomalias geoquímicas por efeito da adsorção de cátions exercida por esses minerais argilosos. Se a associação fosse félsica (rochas silico-aluminosas) o intervalo de amostragem teria de ser bem menor (fraca adsorção). Eventual baixo grau de metamorfismo em partes da região estudada teria efeito semelhante.

5.2 Uma importante conclusão – A aplicação de prospecção geoquímica em detalhe como orientação para sua aplicação à prospecção geoquímica regional, mostrou que a amostragem de solo constituiu uma técnica eficaz e eficiente para ser aplicada em prospecção geoquímica regional no Nordeste semi-árido da Bahia e que a configuração da dispersão, após ajustada pelo processo de média móvel, pode sugerir também o tipo de controle geológico – litológico e/ou estrutural – da mineralização de cobre no vale do rio Curaçá. Possivelmente a metodologia se aplicará a todo o semi-árido do Nordeste do Brasil.

5.3 IDEIAS SUGERIDAS PELO LEVANTAMENTO REGIONAL REALIZADO: os mapas geoquímicos de caráter regional constituem também a base essencial de um MAPA AMBIENTAL

Foram identificadas duas província cupríferas: 1) uma acompanhando o eixo da bacia do rio Curaçá, aparentemente mono-metálica, isto é, somente cobre. 2) outra, cerca de 50km a leste da primeira, com níquel e cobre, mas com forma e extensão ainda indefinidas.

Foi identificada também uma província cromífera, para o sul, com forma e dimensão não definidas, podendo atingir a região de Itiúba e talvez incluindo as ocorrências de Queimadas e Santa Luz, mais ao sul. A titulo de ilustração, em Itiúba, ao sul de Caraíba, localizou-se mais tarde, ocorrência de minerais de cromo e, a sudoeste (em Campo Formoso), havia uma mina de cromita em início de operação. Mais tarde foi descoberta jazida de ouro, em rocha máfica, em Serrinha, a sudeste de Caraíba. Em Floresta, Pernambuco, em 1973-78 foi definida um distrito titanífero. Assim, poderíamos estar diante de um zoneamento metálico. Essa suposição pode estimular importantes trabalhos de pesquisa, lembrando que a amostragem de solo pode ser complementada com amostragem de sedimentos de corrente (e água em regiões de clima mais úmido e evaporação menos intensa que no semi-árido do Nordeste do Brasil) com o objetivo de preparar um mapa ambiental. A parceria prospecção geoquímica regional e preparo de mapa do meio ambiente é altamente desejável.

Entre 1970 e 1975 foi executado um programa de definição de alvos geoquímicos, baseado nos mesmos pressupostos, onde as condições geológico-climáticas são análogas e foram identificados 36 (trinta e seis) alvos geoquímicos na bacia do rio Curaçá. Todos esses alvos foram objeto de estudo mais cuidadoso, com prospecção detalhada, abertura de trincheiras, levantamento geofísico e sondagem rotativa com testemunhos de sondagem. Esse é outro capítulo que poderá ser objeto de publicação, e divulgação, mais tarde.

De qualquer modo, convém salientar a importância da metodização, da sistematização e da continuidade do trabalho, condições essenciais para um programa bem sucedido de prospecção mineral, como posteriormente foi adotado pela CBPM, na Bahia, e outras entidades do ramo no país.

Uma observação final: outros projetos de prospecção geoquímica podem ser comentados sob esse mesmo tipo de perspectiva. (1) Prospecção na região de Lagarto, em Sergipe; (2) prospecção na região da falha de Maragojipe, na parte oeste do Recôncavo baiano; (3) na bacia do Itapicuru, além de dois outros, sendo um em Pernambuco e o segundo na região de Paramirim (Ibiajara/Ibitiara) na parte oeste da Chapada Diamantina da Bahia. Em adição, pode ser expandida a etapa de prospecção regional com discussão e conclusões dos trabalhos sobre os alvos geoquímicos revelados na prospecção regional do vale do Curaçá, mencionado um pouco acima.

Sylvio de Queirós Mattoso

Salvador, BA, 02 de setembro de 2009